Justiça

Defesa de PM preso por chefiar tráfico diz que comando era de filho já morto

Jeffinho Molina foi executado em junho de 2017, mas segundo advogado de Silvio Molina, um delator inocentou o PM das acusações


Jefferson dirigindo uma Ferrari em Paris. (Foto: Facebook)

Assassinado em 18 de junho de 2017, mais de dois anos atrás, aos 25 anos, Jefferson Henrique Piovezan Molina está sendo apontado como o chefe da organização criminosa especializada em tráfico e lavagem de dinheiro, segundo informação vinda da defesa do pai dele, o policial militar Sílvio César Molina de Azevedo, 47 anos, preso desde 25 de junho do ano passado. A alegação consta nos processos derivados da operação Laços de Família e foi reforçada pelo advogado de Molina, Thiago Anastácio, em nota enviada ao Campo Grande News na qual nega a informação de que Molina firmou acordo de colaboração premiada com o MPF (Ministério Público Federal) e a Polícia Federal.

De acordo com o texto, existe sim um colaborador, mas não é Silvio Molina, e esse delator isentou o policial da responsabilidade pelo comando da organização criminosa. Além do patriarca da família Molina, a filhas e a mulher, também alvos da operação, seriam igualmente inocentes. “Não existe nenhuma verdade em afirmar que Silvio Molina pretende fazer colaboração premiada.

“Referida fonte provavelmente tenta causar alvoroço depois que o Ministério Público Federal trouxe que Silvio Molina, sua esposa e filha (todos presos há mais de ano) não tinham relação com o tráfico de entorpecentes, mas sim seu falecido filho Jefferson, assassinado há mais de ano e meio', diz o texto.

A manifestação prossegue anotando que a colaboração premiada foi homologada pelo juiz Bruno César Teixeira, da 3ª Vara da Justiça Federal em Campo Grande, a pedido do MPF, o que equivaleria a chancelar a versão. “Aceitou-se a versão deste 'delator' como verossímil', diz o advogado.

O defensor, na nota enviada ao Campo Grande News, repete o argumento apresentado várias vezes à Justiça de prejuízo no acesso ao cliente, transferido no início do ano para a penitenciária federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte. “A defesa de Silvio Molina ainda não teve acesso ao seu cliente sem que estivesse sendo gravada em áudio e vídeo na Penitenciária Federal, ou seja, violando-se Lei Federal'.

Thiago Anastácio, para defender seu argumento, faz comparação com a atividade jornalística. Diz que “o sigilo entre advogado e cliente é idêntico ao sigilo jornalista e fonte.' Por fim, contesta a afirmação da Justiça de que, como Silvio Molina está preso em Mossoró, as questões referentes às visitas a ele na prisão devem ser tratadas com o presídio e com o juiz corregedor de lá. “Afirma-se que a competência para a discussão desse tema seria no Rio Grande do Norte, porquanto ele está preso por ordem e responsabilidade do juiz de Campo Grande e as consequências dessa ilegalidade são sentidas no processo em Mato Grosso do Sul, processo este que gerou seu envio para aquela unidade prisional'.

O documento se encerra com a sugestão do advogado de que o processo pode ser invalidado. “Quando todo o processo for anulado – o que poderia ter sido evitado meses atrás com um simples ofício do juízo de MS para o RN – que essa nota seja lembrada'.

O que diz a Justiça – Tanto o procurador Sílvio Pettengil, responsável pelo caso, quando o juiz Bruno Teixeira, não se manifestam sobre a colaboração premiada. No dia 29 de junho, o magistrado decretou o levantamento do sigilo do processo envolvendo esse acordo, mas manteve de documentos.

Sobre as afirmações da defesa de Silvio Molina, procurador e magistrado foram categóricos. “A 3ª Vara Federal de Campo Grande comunica não compreender as razões pelas quais o advogado, no exercício de sua salutar função, utilizou-se da imprensa – fiel garantidor do direito jusfundamental à informação da sociedade – como meio de impugnar decisões judiciais ou demonstrar insurgência diante delas, o que deveria ser realizado através das ações e recursos de que dispõe', diz nota enviada como resposta à reportagem. “Com máximo respeito, todo profissional advocatício saber ser vedado ao magistrado 'manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento' (art. 36, III da LOMAN (Lei Organiza da Magistratura)'.

Em relação à pergunta sobre quem firmou acordo de colaboração premiada, o juiz respondeu que a “ação penal citada não está acobertada por sigilo, ressalvando-se parte específica ora sob sigilo documental, as informações narradas podem ser consultadas no livre exercício da função jornalística, inclusive para fins de checar sua veracidade'.

Provas – O procurador Silvio Pettengil não mencionou a colaboração premiada em sua resposta. Disse, porém, que existem provas suficientes a ensejar a condenação de Silvio Molina. “Não fosse assim, o MPF já teria pedido a revogação de sua prisão preventiva', observa a nota.

Em relação à queixa da defesa sobre a dificuldade de acesso ao cliente, o procurador afirma inexistir “o alegado cerceamento de defesa'. Diz o MPF que o advogado não foi impedido pela administração da penitenciária federal de se entrevistar com seu cliente. “O advogado teve, tem e sempre terá oportunidade para falar com seu cliente, obedecidas as regras de funcionamento do estabelecimento penal.

O presidente da comissão de Advogados Criminalistas da OAB/MS, Tiago Bunning, explica que de acordo com a lei os pedidos realizados pelo advogado de clientes que cumprem pena em presídios federais devem ser realizados ao juiz federal do local onde se situa o estabelecimento, ainda que o detento seja precedente de uma outra comarca. No caso, o preso é de Campo Grande, mas está em Mossoró e é o magistrado de lá que deve ser provocado.

Quanto às gravações de conversas realizadas entre advogado e cliente, a OAB/MS repudia a conduta. “Esclarecemos que existe pedido realizado pelo CFOAB (Conselho Federal da OAB) no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ainda não apreciado, visando evitar a gravação de tais conversas'. O advogado cita, ainda, que o Projeto Anticrime do ministro Sérgio Moro visa tornar possível que o juiz autorize a gravação destas conversas, “com o que também não concordamos'.

Filho assassinado – Jefferson Henrique Piovezan Azevedo Molina, morto aos 25 anos, era conhecido como “Jeffinho'. Ele foi assassinado com 8 tiros em junho de 2017, no Centro de Mundo Novo. Formalmente, administrava uma transportadora da família.

À época, a informação da polícia relacionou o crime com a violência empregada pela família na região, inclusive com uso de tortura contra desafetos. Os Molina, segundo a investigação feita durante a operação “Laços de Família', formavam uma máfia com ligações comerciais diretas com o PCC e com o tráfico internacional, fornecendo e comprando drogas.

Só na fase de investigação, o grupo perdeu R$ 61 milhões em negócios, aponta a PF. Quando a operação foi deflagrada, prendendo Silvio Molina e apontando como chefe do grupo criminoso, foram sequestrados sete helicópteros, sendo uma das aeronaves usadas para levar Gegê do Mangue e Paca, lideranças da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), para a execução.

Conforme a polícia, a estratégia garantia “vida luxuosa e nababesca [requintada] aos patrões do tráfico internacional de drogas, que incutiam o temor e o silêncio na região, pela sua violência e poderio'. Também eram utilizados helicópteros para transportar joias, dadas em pagamento pelas drogas.

Jefferson Molina, por exemplo, postava fotos de veículos luxuosos, incluindo uma Ferrari com que posou para foto em Paris, na França.