Dourados

Marmitaria que conseguiu contrato milionário com a Funsaud era dirigida por ex-sócio de secretário

uspeita de fraude em licitação que lhe garantiu contrato avaliado em R$ 1.800.000,00 para fornecimento de refeições aos pacientes do Hospital da Vida e UPA


Renato Vidigal, ex-secretário de Dourados.

 marmitaria Marmiquente é investigada no Ministério Público Estadual sob suspeita de fraude em licitação que lhe garantiu contrato avaliado em R$ 1.800.000,00 para fornecimento de refeições aos pacientes do Hospital da Vida e UPA (Unidade de Pronto Atendimento). 

Na semana passada, um relatório da Controladoria Geral da União revelou que o responsável pela empresa, Ronaldo Gonzales Meneses, já foi sócio do ex-secretário de saúde Renato Vidigal em negócio do ramo de segurança patrimonial.

Além de Renato, que na época do contrato entre a Marmiquente e a fundação respondia pela Secretaria Municipal de Saúde, a auditoria da CGU também identificou sociedade na empresa de segurança com o ex-diretor de departamento na Sems, Raphael Henrique Torraca Augusto. 

Esse vínculo chamou atenção dos auditores, que anexaram ao relatório informações obtidas junto ao banco de dados da Secretaria da Receita Federal.

Na empresa Safety Segurança, Vidigal tinha 60% da sociedade, enquanto Ronaldo e Raphael dividiam o restante em 20% para cada. A sociedade durou entre 2012 e 2014. 

Dourados News entrou em contato com Renato e de acordo com ele, não existiu nenhuma influência no processo de contrato da empresa. O ex-secretário municipal de saúde também afirmou que a Fundação é um departamento independente e que tais decisões não passaram sob a autoridade da pasta.

Renato esteve a frente da Saúde até o início de dezembro, quando acabou sendo exonerado junto a outros quatro secretários da gestão Délia. Logo em fevereiro deste ano, ele foi nomeado coordenador do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) com salário líquido de R$ 23.786,90, conforme o Portal da Transparência. 

A contratação da Marmiquente acabou resultando, em fevereiro deste ano, na Operação Purificação, desencadeada pela Polícia Federal no município. 

IRREGULARIDADES

O relatório da Controladoria apontou várias irregularidades na contratação da Marmiquente. Um delas é o fato da documentação para concorrência já estar pronta antes mesmo do processo de dispensa de licitação ser aberto.  No documento consta uma cotação da marmitaria à Funsaud datada em 10/03/17, enquanto a solicitação para divulgação da concorrência foi solicitada somente em 13/03/17.

Outra situação que intrigou a equipe de auditoria foi o fato de Ronaldo ter sido oficializado como procurador da Marmiquente em 08/03/17, dias antes do processo de disputa ser aberto. Isso lhe garantiu o direito de responder integralmente pela empresa junto à Funsaud.

Além disso, dando sequência na série de irregularidades, no edital do Pregão que consagrou a marmitaria ao fornecimento das refeições a Funsaud exigiu que toda documentação pertinente à disputa fosse retirada diretamente na sede da fundação, mediante cadastro prévio do interessado. 

“O condicionamento da retirada do edital mediante prévio cadastramento da empresa fere os princípios da impessoalidade e da moralidade, pois possibilita que agentes públicos municipais tenham conhecimento prévio à identidade das empresas que participarão do certame dias antes da sessão de julgamento das propostas, dando margem para que tais informações sejam compartilhadas a particulares interessados, os quais poderiam assediar tais empresas a desistirem do certame ou cooptá-las a prática de conluio”, considerou a CGU.

Na disputa pelo certame, a Fundação conseguiu colher cinco cotações, mas na hora de participar da disputa somente a Marmiquente se apresentou como interessada. 

Sem falar que as informações sobre o edital não tiveram divulgação na internet, como costuma ocorrer para ampliar o caráter competitivo da disputa pelo contrato. Para a CGU, isso beneficiou comércios localizados em Dourados e região, já que para colher tais informações seria necessário investir recursos para deslocamento até Dourados ou contratar uma pessoa para tal contato.

EXIGÊNCIAS INDEVIDAS

Ainda na análise do edital, os auditores identificaram exigências indevidas e até vistas grossas do pregoeiro para uma ‘desatenção’ da Marmiquente. 

O edital do certame exigia que “a licitante deverá comprovar que possui no seu quadro de funcionários, pelo menos um profissional nutricionista, devidamente registrado junto ao Conselho Regional de Nutricionistas da 3" Região, o qual será responsável pelos procedimentos operacionais padronizados adotados pela empresa licitante”. 

Para a CGU, mediante acórdãos do próprio Tribunal de Contas da União, tal exigência é ilegal, pois o profissional só deveria possuir inscrição no Conselho Regional de Nutrição da 3ª Região se a licitante fosse vencedora do certame licitatório e, em decorrência disso, assinasse o contrato de prestação de serviço. 

“A cláusula exigida obsta a participação de empresas de outros estados, que teriam que cumprir um item desnecessário, que traria custos financeiros adicionais para apenas apresentarem as suas propostas”, considerou.

E ainda para disputar o contrato, as empresas deveriam ter no corpo funcional um nutricionista com registro em carteira, o que para a CGU e TCU, seria um gasto desnecessário às concorrentes. 

“É possível permitir a comprovação do vínculo com a empresa também com a cópia do contrato de prestação de serviço ou outro documento com o mesmo valor probatório. Em consequência, tal exigência impõe um ônus desnecessário às empresas, à medida que as obriga a manter em seus quadros empregados ociosos e altamente qualificados somente para participarem de licitações”, aponta trecho do relatório.

Além disso, na fase habilitatória, suspeita-se de que tenha ocorrido um favorecimento à Marmiquente, já que o descumprimento de uma exigência do edital acabou passando ‘despercebida’ pelo pregoeiro. 

Na chamada exigia-se que as licitantes apresentassem Certidão de Registro junto ao Conselho Federal de Nutricionista, o que não foi feito pela marmitaria. 

“Embora, a empresa Marmiquente não tenha apresentado a Certidão de Registro junto ao Conselho Federal de Nutricionista, constatou-se que o Pregoeiro, Rodrigo Pereira Benites, não fez constar na  ata de Julgamento qualquer impropriedade na documentação de habilitação apresentada pela licitante”, acusa o relatório.