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Fungo fatal que se espalha por hospitais de todo o mundo pode chegar ao Brasil, alertam especialistas

O C. Auris, no entanto, consegue resistir por mais tempo em ambientes isolados e, mesmo quando um paciente se cura dos sintomas, ele ainda pode estar presente no corpo.


Foto: Melissa Golden/The New York Times

Um fungo chamado Candida auris, que ataca pessoas internadas em hospitais e com sistema imunolĂłgico enfraquecido, vem se espalhando silenciosamente pelo mundo e pode chegar ao Brasil. Nos Ășltimos cinco anos, ele atingiu uma unidade neonatal na Venezuela, varreu um hospital na Espanha, forçou um conceituado centro mĂ©dico britĂąnico a fechar sua unidade de tratamento intensivo e fincou raĂ­zes na Índia, no PaquistĂŁo e na África do Sul. Agora corre o risco de chegar aos hospitais brasileiros, segundo alertam alertam especialistas e a AgĂȘncia Nacional de VigilĂąncia SanitĂĄria (Anvisa). E nĂŁo hĂĄ tratamento efetivo conhecido.

O nome parecido ao popular Candida albicans, que causa a candidĂ­ase, nĂŁo deve causar confusĂŁo. A similaridade se deve ao fato de ambos serem do gĂȘnero Candida, mas trata-se de espĂ©cies diferentes. O Candida Auris causa infecção hospitalar. Em pessoas saudĂĄveis, o fungo passa despercebido pelo corpo humano, sem causar nenhum sintoma. Em pacientes de unidades hospitalares intensivas, no entanto, — sejam adultos ou crianças — pode ser fatal.

É um micro-organismo de baixa virulĂȘncia, que causa sintomas apenas em pessoas hospitalizadas. A maioria dos pacientes fazem quadro de sepse (infecção), com febre, hipotensĂŁo (pressĂŁo baixa), refratĂĄria (resistente) a antibiĂłtico. — Explica Arnaldo Lopes Colombo, professor de infectologia e diretor tĂ©cnico do LaboratĂłrio Especial de Micologia da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP, que alerta. — Existe risco de chegar ao Brasil, e nĂŁo acho que seja pequeno.

Colombo foi um dos tĂ©cnicos que participou da elaboração da nota tĂ©cnica da Anvisa alertando para a possibilidade de chegada do fungo ao Brasil, ou atĂ© de seu desenvolvimento evolutivo dentro dos hospitais brasileiros. Em 2017, a agĂȘncia emitiu o “Comunicado de Risco NÂș 01/2017”, que alertava especificamente sobre relatos de surtos de Candida auris em serviços de saĂșde da AmĂ©rica Latina.

Possibilidade de infecção "nĂŁo identificada"Recentemente, o C. auris chegou a Nova York, Nova Jersey e Illinois, fazendo com que os Centros Federais de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) o incluĂ­sse na lista de germes considerados “ameaças urgentes”. AnĂĄlises internacionais mostram que as amostras colhidas em hospitais de diferentes continentes possuem material genĂ©tico ligeiramente diferente. Ou seja, o fungo nĂŁo estĂĄ migrando pelo mundo, mas sim se desenvolvendo a partir de espĂ©cies mais antigas.

— O fato Ă© que ele emerge, ao longo de um processo evolutivo, num momento da medicina contemporĂąnea em que se usa muito antifĂșngico em ambiente hospitalar. Acredita-se que esse fator tenha um papel e isso explica porque o fungo se torna resistente a pelo menos duas classes terapĂȘuticas. — Conta Colombo. — Aconteceu esse surto na Venezuela e a Anvisa entrou em contato. Fizemos essa norma tĂ©cnica que tem como objetivo alertar os hospitais brasileiros de que existe a plausibilidade desse cĂąndida entrar em nossos hospitais. Temos sistemas ativos de vigilĂąncia para bactĂ©rias. Boa parte dos hospitais pĂșblicos e privados brasileiros sabem detectar as bactĂ©rias pelo nome e sobrenome, mas fungos sĂŁo negligenciados. E cada vez mais vocĂȘ tem fungos candida de diferentes espĂ©cies causando infecção hospitalar no Brasil. Estima-se que 5 a 10% das infecçÔes de corrente sanguĂ­nea sejam por fungos do gĂȘnero candida. E esses sĂŁo os casos mais graves.

O documento publicado pela Anvisa em 2017 afirma que o fungo “ainda nĂŁo foi notificado” no Brasil, mas que isso “nĂŁo significa que nĂŁo tenha ocorrido, pois, como a detecção desse fungo requer mĂ©todos laboratoriais especializados”. “É possĂ­vel que a ocorrĂȘncia dessa infecção nĂŁo tenha sido identificada”, concluĂ­ram os especialistas no texto publicado em março de 2017. O texto estabelece como os laboratĂłrios devem fazer para determinar se a infecção Ă© de fato por C. Auris e como devem ser encaminhados os pacientes isolados.

Mais resistente

A farmacĂȘutica Luana Rossato Ă© uma das especialistas que dedica seu trabalho a entender melhor os mecanismos usados por esse fungo que a ciĂȘncia descobriu hĂĄ exatos dez anos. Ela estĂĄ fazendo um pĂłs-doutorado pela Fundação de Amparo Ă  Pesquisa do Estado de SĂŁo Paulo (Fapesp) na Unifesp, que tem como objetivo entender como corpo humano responde Ă  presença do fungo.

— Ele mata menos que a Candida Albicans, mas a grande caracterĂ­stica Ă© de apresentar resistĂȘncia fĂșngica e de ter difĂ­cil diagnĂłstico, principalmente por laboratĂłrios que nĂŁo estĂŁo acostumados. Pode ser confundido com outras espĂ©cies, tambĂ©m. Foi descoberto em 2009, no JapĂŁo. Ainda estamos investigando como se comporta e o que o leva a ter essa resistĂȘncia.

Rossato explica que a maioria dos fungos não sobrevive por muito tempo em superfícies sem vida, como paredes ou instrumentos médicos; eles em geral precisam de um ser vivo como base para poder se alimentar e manter-se vivo. O C. Auris, no entanto, consegue resistir por mais tempo em ambientes isolados e, mesmo quando um paciente se cura dos sintomas, ele ainda pode estar presente no corpo.

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